terça-feira, 20 de novembro de 2007

ENTREVISTAS A GEORGE BUSH-I--À PROCURA DE BUSH






-- Porra, wake up, man!

--Acorda, Sarja!

--Vá lá acorda, Sarja!

--Wake up, Mr. Sarja Akhmani!

-- Akhmani Sarja, acooooooooooooorda, pá!

--Vá, desperta lá da boçalidade que te é habitual.

--Wahalad Ibib adid, Sarja!

--Wake up, man. There´s lot of work to be done!

--Acoooorda, Sarja!

--Es gibt viel Arbeit fur dir.

--Acor, Sarja, da!

--Sar, Acor, ja, da!

--Aco, Sa, r, da, JÁ!

--Não me chateiem…Quem me chama?

--Os teus patrões.

--Não sabia que tinha tanta gente a trabalhar para mim.

--Foste incumbido de uma missão arriscada.

--Qual? Salvar o planeta do Valentim Loureiro?

--Nada disso. É bem menos arriscada. Vais entrevistar o Presidente dos Estados Unidos.

--Qual deles?

--Qualquer um serve. Excepção feita a um ou a dois, têm sido todos muito parecidos.

--Posso optar pelo George W. Bush?

--Já repararam que o gajo de parvo não tem nada? A ideia é excelente. De mais a mais, o Bush está vivo e as viagens no tempo ainda estão muito caras. Tudo por culpa da Portugal Telecom.

-- Allah Al-akbar! Pois que seja o Bush! Allah Al-akbar!

--Tá bem, então que seja esse tipo!

--Sabes? Também vou entrar nesta coboiada.

--Irra que não ganhei para o susto. Quem és tu, afinal?







--Sou o Alcabideche José, o operador de câmera da TVI que te vai acompanhar nesta grande reportagem.


--Alguém que eu conheça?


--Vá lá, não sejas assim. Sabes tão bem como eu que sou o lado negro da tua alma…


--Ir contigo!? Nem pensar. Antes só que mal acompanhado. Além disso, não dizes coisa com coisa…Não, tu não vais comigo e não se fala mais nisso!


--Mas eu sou o teu pior amigo.


--Meu amigo!? Tu ires comigo? Só por cima do meu cadáver, Alcabideche José, animal.


--Está bem, sou um dos teus melhores inimigos, qual é o problema?


--Nenhum, claro está. O menino dorme com a Celina do Kuwait, que por acaso é minha namorada, e acha que está tudo bem.


--Ora, quem tem boca vai a Roma…


--Que é que estás para aí a dizer?


--Hum, nada que valha a pena ser pensado. Ala que se faz tarde, Sarja. Vamos?


-- E ele a dar-lhe. Já te disse que não vou. Detesto-te com quantas forças tenho na minha alma de reporter iraniano.


--Seja! Não faz mal. Sendo assim, não tenho outro remédio senão telefonar ao José Eduardo Moniz da TVI, ao Abib de Jesus Anwar de Macedo do Jerusalem Post, ao John Fernandes Frost do New York Times, ao José Rilke do die Welt e ao Borges da Time…


--Os meus patrões…Serias capaz de denunciar-me?


-- Claro que sim!


--Tens toda a razão. É sempre bom cumprir ordens dos nossos superiores hierárquicos. Vamos a isso?


Assim que chegámos à Casa Branca, fomos imediatamente recebidos pelo Presidente dos Estados Unidos. Simpático como poucos, George W. Bush desfez-se em cumprimentos. Depois acrescentou que sendo a pontualidade imprópria de um presidente americano, só nos restava esperar por ele. Foi então que se sentou num cadeirão verde, acendeu um charuto que lhe fora oferecido pelo Fidel de Castro, sorriu com a inteligência duns dentes muito brancos, afagou a ponta esquerda do bigode, cruzou e descruzou as pernas, e pôs-se a esperar por nós. E assim se passaram muitos anos. Entretanto, o fumo do charuto do mundo, sempre a subir em espiral, sofrera dolorosas mutações: enquanto a China tentava impor a Democracia e o Capitalismo ao Ocidente, a Europa e os Estados Unidos tinham adoptado um regime ferozmente comunista. Por outro lado, o nosso sistema solar havia sido colonizado não só por capitalistas ultra-liberais, como também por comunistas ortodoxos, que se guerreavam entre si. Enfim, dois perigos ameaçavam outra vez os mundos— a ausência de Utopia e os excessos dela.

--Valha-me Deus, Alcadideche José. Será que que estamos condenados a isto?


--Acorda, Sarja. A isto? A que te referes?


--A “isto”, Alcabideche José. Ao facto de, em 2050, estarmos a cometer novamente os mesmos erros do passado…


--Acorda, Sarja. Tu e a tua sonolência. Estamos em 2007. Olha, o sr. Presidente dos Estados Unidos está a chamar por ti…


--Sarja, sou eu, o Presidente Bush. Recebi o seu email, Sarja. Uma curiosidade, Sarja: como foi que me encontrou, Sarja?


--That´s a long story, Majestade, Mr. President. Calcorreámos a pé a América Latina…Brasil, Argentina, México, Malásia, Peru…foi ou não foi, Alcabideche José?


--Pois foi. E até conhecemos umas peruas de se lhes tirar o chapéu. Sarja...O lado direito do bigode do presidente trocou de lugar com o lado esquerdo do bigo...


--Não digas disparates, Alcabideche.


--Hum…Foi então que se lembraram que eu podia estar na América do Norte, certo?


--Pois foi. O Sarja é que disse que se calhar o sr. Presidente podia estar a viver mais a norte do continente europeu.


--Americano, Alcabideche. Sr. Presidente, Majestade…O caso é o seguinte: viemos cá fazer uma reportagem a mando dos nossos patrões.


--Whom do you work for?


-- Majestade, Mr. President…Sou jornalista do Expresso, da Bola, do Correio da Manhã, da TVI, do New York Times, do Jornal de Letras, do Chade Review of Books e de uma certa rapariga do Kuwait.


--Sarja, muito bem, Sarja. E você…Sarja, como se chama o seu amigo, Sarja?


--Alcabideche José, Mr. President.


--Que é que está ele a fazer aqui?


--É operador de câmera da TVI.


--Muito bem. Posso tratá-lo por Al?


--Claro que sim! Sarja...Já reparaste que o lado esquerdo do bigode do presidente trocou de lugar com o lado diteito do bigo…


--Cala-te. Vamos então ao trabalho, Majestade, Mr. President?


--Sarja, vamos a isso, Sarja. Faça as perguntas que quiser que eu reponderei se quiser, Sarja.


--Com certeza. Mr. President….Parece-lhe justo que morram tantas crianças no Iraque?


--Sabe, Sarja… Antes de responder, Sarja, tente acompanhar o meu raciocíonio e verá que tenho razão, Sarja…A questão é a seguinte: ou todas as crianças islâmicas são terroristas ou então só algumas crianças islâmicas são terroristas, certo, Sarja?


--Certíssimo. Não concordas, Alcabideche?


– Anh? Não me chateies com essa conversa. Não vês que estou a filmar o gato do Presidente?


--Continuando: se todas as crianças islâmicas são terroristas, Abdulah é de certeza terrorista.


--Mas isso é mais que evidente, Mr. President!


--Mas se, pelo contrário, Sarja, nem todas as crianças islâmicas são terroristas, então existe pelo menos uma não terrorista a quem podemos chamar Zeca Abib, Sarja. Logo, se Zeca Abib não é terrorista, todas as crianças islâmicas se chamam Abdulah e são terroristas.


--Bem visto, sim senhor.


--Além disso, sendo o Iraque um país europeu...Veja lá que eles até votaram contra a Constituição Europeia, baluarte dos princípios do Neoliberalismo económico na Europa. Sacanas! Don´t you agree?

--Sarja, o presidente tem toda a razão. Aliás, o Jacques Chirac, o presidente do Iraque, ficou decepcionadíssimo com os resultados do referendo… Sarja, o lado direito do bigode...


--Alcabideche…Cala-te e filma!


--Sarja, o presidente tem toda a razão: os iraquianos são uns ingratos. Uns pulhas. Esqueceram-se do desembarque na Normandia, do resgate do soldado Ryan e de todo o esforço criativo do Spielberg para filmar aquela maravilhoso plano-sequência…


--Sarja, estou a ver que o que o seu amigo Al “got the point”…


--Majestade, Mr. President…Estou em crer que o Alcabideche compreendeu tudo o que foi dito nesta conversa. A minha alma está parva.


--Sarja, a seu tempo o saberá, Sarja.


--Tem toda a razão, Mr. President, Majestade.

Sarja Akhmani, repórter iraniano

Sem comentários: